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Pesquisa no Abismo

Minha Arte

Mensageiro Obscuro é um escritor performático que possui um espetáculo solo no qual recita textos utilizando vestuários exóticos, maquiagens e outros recursos criados por ele. Escreve prosas poéticas, poesias, contos, crônicas, pensamentos, frases e experimenta outras formas de escrita.

Seus principais estilos e temas em suas obras são: aventura fantástica, realismo fantástico, autobiografia, onirismo, ultra-romantismo, simbolismo, drama, horror e suspense, ocultismo e misticismo, mitologias, filosofias, surrealismo, belicismo, natureza, comportamento, erotismo e humor.

domingo, 17 de fevereiro de 2013

Inquietude


Acordo inquieto após vagar
pelas estreitas lacunas,
fugindo da tensão e vergonha
que torram meu cérebro.

Esses lábios ainda caminham
aos trancos pelas tortas
vielas do pensar
e no pesar durmo.

Um grito se desloca
por meus neurônios
e permaneço mudo
na silenciosa introversão.

E de tantas realidades
só extraí lisergias,
delas surgiram vergonhas,
um esqueleto desconstruído
e uma larga inquietude.

- Mensageiro Obscuro.
Agosto/2011.

-- Glossário --

Lisergia =
"Lisergia é o acrônimo de LSD, Lysergsäurediethylamid, palavrão feio... é o estado de alucinação e psicodelia. Composição das palavras gregas psiké (mente) e deloun (sensorial). É um termo que surgiu na década de 60 quando, com o uso se drogas alucinógenas como o LSD, muitas pessoas tiveram abertas as portas da percepção. É uma manifestação da mente que produz efeitos profundos sobre a experiência consciente.
É aquela viagem louca que você tem ao qual desloca sua mente do seu corpo, onde sensações são sentidas na mente e não no corpo, psicodelia total, assim eram por exemplos Pink Floyd e Creedence em seus vídeos clipes.
Estado em que vivem os chapados... que curtem um barato e voam para uma realidade imaginária e ilusória... tipo os fanáticos que se iludem com o Paraíso.
Progressive é a vertente mais calma, lenta e de extrema lisergia do Psy Trance."
- Bruno Filizola via Dicionário Informal.
(correções de minha autoria)

Foto: "Hand with Reflecting Sphere" de M. C. Escher, 1935.
Fonte: http://www.mcescher.com

terça-feira, 18 de setembro de 2012

Na Têmpera do Ódio

Minha pele torna-se couraça
Repleta de espinhos e lâminas
Meus dentes e garras crescem
Enquanto a musculatura amplia.

Transformo-me no terror vivo
Enquanto meu sangue esquenta
E o dos inimigos esfria
Diante de minha face feroz.

Meu rosto é pintado para a guerra
E luto furioso sem hesitar,
Carrego armas especiais
Para realizar minhas missões.

Sou forjado na têmpera do ódio
A arma malhada para resistir,
Voraz contra oponentes poderosos
Mostrando o monstro manifestado.

- Mensageiro Obscuro.
Agosto/2012.

Foto:  imagem do personagem Conan, as referências ao ilustrador não foram encontradas.

segunda-feira, 14 de maio de 2012

Feridas

As dores vieram intensas
pelos elos quebrados,
sentimentos amadureceram,
pensamentos expandiram
e o passado foi avaliado.

Nos erros de cá e lá
as feridas cicatrizam,
a negatividade morreu
e... existe algo melhor
para mim lá fora.

- Mensageiro Obscuro.
Abril/2012.


Foto: Homem em momento de liberdade. Sem referências encontradas no Google Imagens.

sábado, 24 de março de 2012

Doce Realidade

"(...) And nobody does it better
makes me feel sad for the rest
nobody does it half as good as you
baby baby darling
you're the best
baby you're the best (...)"

- "Nobody Does It Better" de Carly Simon.

Quando estive tão cético sobre o amor, tão farto das raras farras vividas que já nem tinham mais sabor, e sem ter sentido a intensidade de um amor verdadeiro e correspondido aconteceu de eu ser procurado por uma mulher de uma terra longínqua por uma comunidade da rede social Orkut. Quando encontrado virtualmente por ela em dezembro de 2010 eu estava sem feridas abertas, apenas com cicatrizes de decepções passadas e superadas. Preferi pensar que sou uma peça de quebra-cabeças sem encaixe exato com outras peças, porém um "bon vivant" dentro do meu possível, mesmo parecendo um alienígena. Fui surpreendido por uma série de semelhanças enquanto a vida pareceu fazer piadas exóticas comigo, mas não recuei, a curiosidade foi maior enquanto eu me envolvia lentamente. Após meses de tantas trocas de experiências, confissões, brincadeiras e risos começamos a conversar bastante em quase todos os dias pela internet.

A distância que nos separa não impediu meu fascínio por sua personalidade, comportamento, pensamentos, sentimentos, objetivos e tantos outros detalhes. Nesse ponto criamos a sintonia mental. Marcamos minha viagem, tivemos entraves, aconteceram imprevistos, mas decidi viver uma grande aventura ao viajar de avião para conhecer Curitiba, a distante capital do Estado do Paraná, bem longe do Estado do Rio de Janeiro onde nasci e fui criado. Então, em outubro de 2011 eu conheci pessoalmente uma mulher que mexeu com meu ser nos últimos meses. Foi inédito viajar de avião e conhecer a capital de outro Estado, outras descobertas me aguardavam e eu torcia por isso, tanto que esperava viver um romance intenso, porém curto por conta de nossa distância.

Cheguei a São José dos Pinhais e esperei por ela, nos encontramos e abri os braços cobrando meu abraço prometido, demos um forte abraço giratório e quando a coloquei ao chão falamos poucas palavras, quis criar um jeito para beijá-la, mas não tive palavras certas, então a puxei pela cintura e nos beijamos intensamente. De nosso primeiro beijo criamos a sintonia física e ao pegar um ônibus para Curitiba aos beijos uma trilha sonora romântica do rádio nos acompanhou, justamente tocou a música "Nodody Does it Better" de Carly Simon, a qual é trilha sonora do filme "007 - O Espião Que Me Amava" (The Spy Who Loved Me) de 1977, que anteriormente eu já lhe dizia que combinava completamente com seu rosto de espiã soviética.

Percebemos por pensamentos e sentimentos que vibramos na mesma sintonia mental e física; após tantos beijos, mordidas, abraços, cafunés, toques, “upas” e colinhos eu a pedi em namoro pois tive certeza que ela era a mulher que eu queria. Nossa aventura foi de oito lindos dias apreciando cada momento juntos como se fossem os últimos, sem medos e sem travas. Esse foi o encontro de dois aventureiros livres tão famintos pela descoberta de um novo mundo, onde estávamos envolvidos profundamente. Iniciamos a construção de nosso romance e essa foi a primeira de outras aventuras, pois ainda temos muito a viver em conjunto com nosso companheirismo e diálogo. Parece um sonho... mas é nossa doce realidade.

- Mensageiro Obscuro.
Janeiro/2012.

Foto: Jardim Botânico de Curitiba - PR, foto tirada por mim no meu último dia de passeio em 27 de outubro de 2011.

sexta-feira, 16 de março de 2012

Aprendi a Vencer no Amor

 Certa vez aprendi em algum local que tudo que podemos dar aos outros deve existir primeiro em nós, realmente esse conhecimento é verídico. Quando temos por nós mesmos o amor, companheirismo, compreensão, respeito, perdão e outros sentimentos; transmitimos essa energia saudável adiante para quem consideramos importantes em nossas vidas. Descobri que estou em constante construção e para me edificar preciso remodelar rotineiramente uma base firme para sustentar todo o resto. A vida é dura e sem boas estruturas eu entraria em decadência, mas não me permito a viver da pior maneira, sigo em frente acreditando em mim. Tudo que passei a viver quando me tornei aventureiro teve mais sabor, aprendi o valor profundo da singularidade, liberdade, privacidade e introversão, esses são os quatro sabores que degusto tanto como se fosse um glutão voraz ou o mais refinado dos apreciadores de iguarias. O verdadeiro aventureiro tem um espírito guerreiro no qual ele assume riscos de sucesso e fracasso, perde seus medos e desapega do que lhe faz mal. É assim que a vida segue para mim, desapegando de medos e travas que atrapalham a vida, pois ela é curta demais para que eu sofra com todas as negatividades que posso criar e nutrir.

Os problemas e dores obtidos devem tornar-se aprendizado para sermos melhores de modo geral e cada obstáculo só reforça que não devo me deixar vencer pelos problemas, mas devo sim me tornar cada vez mais poderoso para derrotá-los. Perdi o medo de me entregar de corpo e alma para quem amo, assim como abandonei o medo de assumir meus pensamentos e sentimentos que poderiam ser pisados por tal pessoa. Larguei meu orgulho, frieza, insegurança, arrogância, prepotência, receio e até parte da racionalidade para me entregar ao meu propósito de experimentar um amor verdadeiro e faria tudo igual se existisse uma máquina do tempo.

É fatídico que sofri e ainda sofrerei com o amor, mas regenero-me dos maus bocados e sem amor a vida é amarga, portanto invisto em mim, na família, nos amigos e em uma companheira. Consegui até sentir a raríssima sintonia profunda entre mente e corpo que por vezes só sentimos com uma ou duas pessoas durante nossa existência, aprendi muito com isso e sigo adiante. No final de diversos sofrimentos saí vitorioso ao eliminar minhas antigas barreiras mentais e comportamentais, não me arrependi de nada que fiz por entender isso como aprendizado, e sei que tenho energia para amar intensamente outras tantas vezes.

Passei a viver intensamente e não sei se essas batidas do coração, beijos e abraços serão os últimos, então não nutro negatividades por mim e nem pelos outros. Quando amamos a nós mesmos e a certas pessoas é possível até o retorno e o renascimento de antigos sentimentos, isso pode ocorrer quando ambas as partes se entregam a recomeçar após amadurecer. Vivi ganhos e vitórias, assim como perdas e derrotas, mas é justamente com o pior lado da vida que aprendo o melhor para mim e prossigo minha jornada solo.

Vivo como um índio guerreiro que luta de peito aberto sem medo das armas inimigas, sem armaduras, sem elmo, somente de corpo pintado, com cicatrizes de antigas batalhas e com o espírito exalando todo o poder pelos poros. Caminhando pela floresta com a cabeça erguida e arma firme nas mãos dentro da selvageria existencial onde posso ser predador e presa, mas não recuo e nem me rendo pois nasci para essa guerra. Eu costumo me apresentar citando que "sou um aventureiro que busca saberes e prazeres sem grilhões e raízes" e de fato estou certo. Ninguém pode me tirar quem sou e o que sou, nem mesmo eu, por isso confirmo que estou em guerra e que já perdi muitas lutas, mas venci muitas outras e por isso caminho na estrada que me torne alguém melhor.

- Mensageiro Obscuro.
Março/2012.

Foto: Montanha canadense encontrada no Google Imagens.

domingo, 4 de março de 2012

Máscara do Falso Poder

Há pessoas egocêntricas que não melhoram por dentro enquanto a vida passa, esses indivíduos possuem um passado capaz de rasgar suas mentes e seguem adiante com feridas abertas, adotando o sofrimento e pessimismo como estilo de vida. Sua decadência impede seu avanço vital em alguns campos como intrapessoalidade, vida social, afeto e sexo e até estudos e trabalho. Então, tal pessoa pode revelar-se confusa, orgulhosa, prepotente, arrogante, agressiva, grosseira, frustrada e insegura, e nesse sistema é possível criar um conjunto de mecanismos de fuga da vida e de si mesma precisando fingir-se de fria, indiferente, insensível e racional na tentativa vã e infantil de parecer superior; mas tudo não passa de uma maquiagem para disfarçar sua grande passionalidade e fragilidade notáveis. Têm pessoas infelizes e ferem-se facilmente no decorrer da vida, mas todo esse conjunto de defeitos cria defesas já catalogadas pela psicologia. Estar vivo na gangorra dos altos e baixos que ocorrem não é mesmo fácil para nós, em especial para quem entende a vida da pior maneira possível com um pessimismo corrosivo capaz de amargar as coisas mais belas e doces da vida; e de tanto medo da continuidade do ciclo vital tal ser acaba cometendo atos sem noção, justificando-os levianamente com argumentos pífios dignos de uma pessoa mimada.

Quando o amor próprio e a realização pessoal são minúsculos passa a existir uma prisão em nós mesmos transformando-nos em seres incapazes de lidar com nossos problemas em busca de soluções. Sem uma boa estrutura intrapessoal e emocional não poderemos ser grandes o suficiente para oferecer muito aos demais, nesse momento um sentimento de pequenez e amargura toma conta da mente dificultando a vida de forma geral. Portanto, nesse caso quem é muito pouco não terá conteúdo e atitudes para saciar as grandes personalidades encontradas durante a existência, devido a esses serem dotados de exigências proporcionais ao que podem oferecer e estes não se contenta com migalhas. Devemos aprender que superamos os problemas ou deixamos que eles nos superem, portanto devemos estar de bem conosco ou a vida nos ferirá intensamente.

O masoquismo é constante na vida de quem persiste em errar das mesmas formas, portanto a repetição gera a morbidez e esta se prolonga no apego pelo autoflagelo. É comum nos problemáticos que atirem seus problemas para “debaixo do tapete” ou "para cima dos outros" como mecanismo de transferência de sua negatividade para um alvo, assim tentando se aliviar de suas dores. Mentes perturbadas tornam-se uma “colcha de retalhos” que de tão emendadas não se tornam uniformes o suficiente para prosseguirem numa vida saudável em praticamente campo algum de suas necessidades. Existem várias fugas para a realidade e é até bom recorrer a elas vez ou outra, porém quando as fugas são mais comuns que o enfrentamento realista certamente possuímos um grave transtorno e trauma a corrigir, em especial o medo de viver que é realmente patológico.

Não é certo um indivíduo saudável e de bem com a vida guardar mágoa, rancor, raiva, tristeza e outros sentimentos negativos por gente muito doente da cabeça, é mais viável entender que essas são pessoas problemáticas e que precisam ser cuidadas e protegidas de si mesmas. Uma pessoa que apresente tantas defesas dá um sinal claro de fraqueza pessoal em termos afetivos e emocionais, porém mais fraco é quem não quer mudar e se prende a viver da pior forma. Problemáticos costumam ressaltar seus problemas e defeitos como regras inalteráveis; com isso persiste um drama quase teatral para chamar atenção que dizem ignorar. Gente assim dificilmente vence obstáculos, pois se consideram menores que seus entraves para as realizações. Tais seres escondem seus rostos por trás da máscara do falso poder e assim permanecem definhando em si próprias sendo dignas de pena e de ajuda especializada com tratamento adequado antes que seja tarde demais. 

- Mensageiro Obscuro.
Março/2012.

Foto: Máscara veneziana com tema musical sem referências encontradas através do Google Imagens.

domingo, 20 de novembro de 2011

Baseado em Desejos Reais

Você reclama quando minha cabeleira se mistura com a sua, mas no fundo gosta quando nossos fios se mesclam nos abraços quase agressivos, quando meus lábios roçam sua face delicada e seu pescoço convidativo e sei que isso te provoca. Da última vez que nos encontramos ficamos com os corpos colados e você disse que sou como um urso faminto com boca úmida e olhar animalesco, então, ao te olhar assim, minha boca gulosa se molha por eu ter fome e sede além de sua compreensão, isso é natural, faz parte do meu ser.

Lembro que você se arrepiou ao observar meu sorriso misterioso dizendo que te causava uma sensação esquisita, mas cogito saber que sensação é essa... poderia ser um medo de viver algo etéreo, diferente da habitual constância materialista que chama de “relacionamento sério” ou algo do tipo. É certo que sou muito racional e pouco sentimental como bem me conhece, mas na sua presença deixo minha humanidade de lado e abandono-me no piloto automático, instintivo, ligado nos 220w. Com essa alta voltagem tento cativar seus pensamentos, sentimentos, carícias e gerando confissões. Quero que tenhamos uma sintonia secreta, quero algo só nosso e que pelas sensibilidades de nossos corpos tenhamos ligações difíceis de traduzir... nessas vibrações contínuas sigo por sendas complexas.

Por hora, tudo é memória e eu sigo trilhas distantes demais da compreensão do comum, onde não ouso pronunciar as traduções do que se passa em mim; minhas mãos seguem correndo por canetas e papéis tentando espremer o sumo das facetas do meu interior, estou procurando mais cargas expressivas entre construções e escombros no meu universo interior e isso não é fácil, é lá onde fico quando quero e por quanto tempo quiser sem a entrada de forasteiros.

Sou vivente na interseção entre a realidade e fantasia tentando expressar o que penso e sinto nas nuances de tantas variações. Assim como um fantasma eu sumo e apareço, viajando entre realidade e fantasia, dessa forma fundo-me nas nuances da matéria e éter. Desejo captar saberes e prazeres que me tirem daqui por agora, o tédio me consome e uma aventura inesperada mataria por completo esse verme parasita que insiste em me devorar por dentro: o maldito tédio.

Sinto-me um tanto decadente, quero e vou mais além, não em físico no momento, falta-me dinheiro e um tanto de coragem para sair de madrugada e ir onde quero, seria até complicado ir para tais locais, moro longe demais deles e a viagem já seria por demais tediosa. Caso existisse o poder de teleporte eu poderia tomar um banho relaxante e me vestir para me teleportar para onde quero, eu iria para onde batesse vontade, sem enfrentar o trânsito, pedágios, dinheiro de passagem, violência, poluição sonora, fumaça de cigarro, gente que fala cuspindo, gente idiota e outras coisas. Certamente eu apreciaria essas viagens solitárias espectrais, isolando-me onde fosse escuro e gelado como o abismo que tanto aparece em meus sonhos, como montanhas e cavernas a ser aventuradas por quem tem um peito nu sem medo do frio dos perigos.

Eu estaria em casa quando adentrasse um espaço natural totalmente isolado das minhas rotinas, me manteria longe dessa vida provinciana que me enoja e nesses inusitados momentos eu sentiria um sono cansado somado com tédio. Bem, você sabe que sou aventureiro do conhecimento, que os saberes e prazeres me atraem e cativam e com tantos fascínios sou figura solta, que vivo em você uma nova aventura repleta de acontecimentos que por vezes fogem ao controle, mas é assim que gosto de viver nessa gangorra de inspirações nas quais me afundo como noutras coisas da vida: sem grilhões e raízes. Então não diga nada quando meu corpo falar o que quer de você, apenas aceite ou negue, estou preparado para ambas as decisões, então não fale, simplesmente faça intensamente... a vida é curta.
Saiba agora: só consigo amar desapegado sem cobranças, ciúmes, possessividade, loucura e perturbações, assim vivo, assim amo... só quero outros amores doces, a vida já é por suficiente amarga em sua dura realidade.

Devemos buscar amor e poder em nós mesmos, pois ter amor e poder em coisas e pessoas é só um meio de usar muletas para não tombar no próprio fracasso, por isso eu te amo, mas sem o apego que tantos insistem em ter ao amar e viver. É dessa forma que mostro pelo corpo e pelas palavras o quanto te desejo e quero bem. Quando eu sentir qualquer amarra sua vou me soltar como um escapista experiente, não por temor do cárcere, mas por ser rebelde o suficiente para viver o egocentrismo de fazer e ser apenas o que quero, assim sou e assim continuarei a ser. Entendo que não posso cobrar que ninguém tente entender a intensidade e sutileza de meus mistérios e segredos, assim como de outras tantas coisas, então caso queira me encontrar estarei me aventurando por vários cantos desse mundo deixando minhas pegadas metamórficas e talvez eu volte com mais umas cicatrizes como recordações.

- Mensageiro Obscuro.
Setembro/2010.

Foto: Gangorra encontrada no Google Imagens.

quinta-feira, 22 de setembro de 2011

Um Disparo

Quando nada mais faz sentido o fim parece ser covardia e egoísmo, mas é apenas libertação da rotina de acordar e mover. Viver tornou-se algo insípido nesse mundo acinzentado, meu corpo dói sem causa aparente. Faço minhas últimas ações, desistindo do pensamento torpe de registrar uma carta de despedida, então vou para o quarto no qual tudo está preparado.

A vida e a morte brincam numa gangorra como duas crianças agitadas enquanto o tambor do revólver é preenchido com apenas uma munição. Minhas dores são emaranhadas da azia de existir e pela fome doentia de apagar-me de vez. Um disparo de metal contra o céu da boca jorra rubro encharcando paredes após o estampido que findou uma existência obsoleta.

- Mensageiro Obscuro.
Agosto/2011.

Foto: Revólver invertido encontrado no Google Imagens sem referências disponíveis.

quinta-feira, 15 de setembro de 2011

Vibração da Alegria

A poderosa energia da vida
entrou gentil e agradável,
trazendo brilhos e riqueza
de autoconfiança e coragem
para superar obstáculos.

O íntimo radia em escalas,
enquanto o tempo virou seiva
nutrindo a maturidade
a fim de libertar risos
antes tão inibidos.

Chegou a vibração da alegria,
deixando portas e janelas
totalmente escancaradas
aguardando a invasão
de realizações pessoais.

- Mensageiro Obscuro.
Setembro/2011.

Foto: "Joy Vibrations" de Freydoon Rassouli.
Página do artista: Rassouli

domingo, 21 de agosto de 2011

Doppelgänger

Besta lendária e maldita, desgraça caminhante, invadia a essência dos vivos para seu prazer e copiava minha forma para destruir meu nome! Ser macabro e amorfo, pela forma que confundia meus amigos eu estraçalharia sua carne e ossos. Sem rosto e personalidade próprios ele me copiava até nos detalhes, simulava minhas habilidades e poderes parcamente. A vida do sósia tinha de terminar, eu o livraria do fardo existencial. Solucionaria seu problema com violência pois minha boca não seria o bastante.

Esse fardo de identidade dismorfa deveria cessar com os meus ataques. Quis destruir sua forma inumana libertando esse mundo de sua presença. Desejei-o como oponente em uma batalha, não mais veria seu desrespeito, não mais ouviria suas zombarias. Outras perturbações eram menores, seu sangue seria devorado pelo solo naquele instante.

Fui destemido ao enfrentar meu inimigo, minha existência estava abalada, pelo invejoso e cruel doppelgänger! O copiador das entranhas subterrâneas, o pesadelo dos reflexos distorcidos. Tivemos uma grande batalha física e mística, tamanho duelo foi delicioso ao revelar que sou o verdadeiro Mensageiro Obscuro. Nem tudo podia ser copiado e assim venci ao decapitar quem nunca foi alguém. Venci a batalha, mais um monstro foi derrotado e o Mundo Onírico ficou um pouco mais habitável para criaturas como eu.


- Mensageiro Obscuro.
Junho/2007.


-- Glossário --

Doppelgänger = É uma criatura mitológica de lendas germânicas que podia imitar a forma física, voz e jeito do humano copiado. Lendas contam que o doppelgänger é um humanóide metamorfo que só pensa em si mesmo, possui poderes mentais moderados mas eficazes para manter seu disfarce quando assume a forma de alguém após matar a identidade original. Várias lendas giram em torno desse ser que podia ser também uma versão de personalidade oposta a do copiado, surgindo de alguma forma misteriosa para tomar seu lugar na sociedade. O nome "doppelgänger" se originou da fusão das palavras alemãs: "doppel" (significa duplo ou duplicata) e "gänger" (andante, ambulante ou que vaga).


Foto: "Doppelgänger" por Danny Licul.
Página da artista: Danny Licul

domingo, 7 de agosto de 2011

Medalhas

No octógono bélico
lutamos tecnicamente
testando nossos limites
e ao sangrar com dor
recebemos aplausos.

Duas armas vivas atacam-se
com socos, chutes, cabeçadas,
cotoveladas, joelhadas, torções,
encontrões, projeções,
reversões e imobilizações.

Usamos bloqueios, esquivas
e aparamos golpes
rangendo os dentes
enquanto observam-nos.

Somos feras na jaula
com cicatrizes gravadas
como nobres medalhas
sob nossas peles.

- Mensageiro Obscuro.
Junho/2011.

Foto: Stephan Bonnar vs. Krzysztof Soszynski, lutadores de UFC (Ultimate Fight Championship) em combate.

quarta-feira, 22 de junho de 2011

Amizade Colorida

Quando nos tocamos tanto
por sorrisos e olhares,
colamos nosso corpos
quase sem segundas intenções.

Nossa bela sintonia
cria algo muito íntimo,
onde experimento nuances
de diversas cores vivas.

Então, com essas tintas
fazemos um degradê
de suaves e profundos
desenhos em nossa tela.

Na amizade colorida,
somos pintores nus
sem tradições tolas
que nos fariam sofrer.

- Mensageiro Obscuro.
Junho/2011.

Foto: "HD Multi Colored Lines" por Darkdragon15.
Portal do artista: Darkdragon15

segunda-feira, 13 de junho de 2011

Antítese Humana

Perturbei-me com a cientista
maldita que testava-me
com aprimoramentos sintéticos
aplicando-me drogas pesadas.

Vivi num labirinto de confusões
onde eu não era parte de nada,
com um número serial tatuado
para identificarem meu propósito.

Rebelei-me de vez
utilizando meu poder genético
para quebrar minha jaula
em uma fuga desesperada.

Roubei um traje especial
e corri por vários terrenos,
somente fixando moradia
nas mutações intelectuais.

Sou um híbrido, uma peça solta,
um nômade açoitado pela vida,
uma antítese humana moldada
para ser arma biológica.

- Mensageiro Obscuro.
Junho/2011.

Foto: Código genético encontrado no Google Imagens

segunda-feira, 16 de maio de 2011

Jogo Enfadonho

Trocamos vários sorrisos e olhares
flertando à distância pela parede de vidro
que nos une e separa,
então rabiscamos em nossas cabeças
um enigma sobre quem realmente
somos e o que viveremos.

Movemos peças num xadrez
interpretando personagens
como numa peça teatral,
trajando máscaras e capas
num baile onde os outros
são apenas bonecos.

Entrei em seu jogo enfadonho
então você embaralha as cartas,
eu as corto, aposto minhas fichas
e até blefo para quebrar sua banca.

Não temo o que a vida nos reserva
mas resta saber se você tem coragem
de se despir dessa armadura
para me encarar.

- Mensageiro Obscuro.
Maio/2011. 

Foto: "The Wish" de Theodor Von Holst, 1841.

sexta-feira, 29 de abril de 2011

Nudez

Tentei calcular sem sucesso
e confinei-me numa cela gélida
onde chacoalhava desesperada
uma fera chamada libido.
Nas nuances do suave e bestial
aderimos aos nossos desejos,
desatando das prisões
para encontrar nosso refúgio.

Entrelaçados e agitados
ignoramos tudo e todos,
encaixando nossas peças
num jogo de movimentos,
no qual o clímax revelava
duas formas de nudez.

- Mensageiro Obscuro.
Abril/2011.

Foto: Modelo da grife Madeleine Chemise com lingerie e máscara pelo site de lingerie Allure Lingerie.
Portal da grife: Allure Lingerie

sábado, 26 de março de 2011

Sorriso Convidativo

 Eu vivia mais um clássico dia de tédio dominical, meus amigos estavam com suas namoradas ou descansavam diante das drogas midiáticas, por isso não os chamei para que me acompanhassem em mais uma aventura; como era de costume esse seria um passeio noturno solitário para matar o tédio. Eu me sentia um lixo e não revelaria isso a ninguém, pois certas coisas são tão minhas que minha boca não pode explicar. Mataria o tédio ou ele me mataria por dentro, essa era minha sentença, por conta disso me arrumei com as melhores roupas e perfume para um passeio casual; peguei minha carteira com umas pratas, chaves, caneta e papel e fui andando pelas ruas naquela noite. Após caminhar a pé encontrei um inferninho de pouca luz, decoração retrô, mesas com algumas pessoas variadas e mulheres que pareciam esperar um convite para conversa. E era um dos poucos homens no local, para minha felicidade eu teria menos concorrentes caso tentasse me aproximar delas, mas não queria conversar com ninguém, talvez não ainda. Fui recebido por uma linda e simpática balconista que apresentou-me o bar, disse-me que o microfone era livre para artistas; e eu nem pensava mais em produzir artes.
Como eu já me encontrava condenado a ser demitido de uma latrina profissional fui abraçar o Diabo travestido de bebida alcoólica, os meses anteriores foram sofridos no trabalho e por um raro momento eu nem mesmo sabia o que queria para mim. Resolvi beber solitário do lado de fora do bar, tentando avistar estrelas e mantendo-me isolado, queria até andar mais e deitar numa grama para observar as belezas noturnas, mas lá fiquei. Avistei várias mulheres com diferentes belezas e umas nem tão agraciadas pela natureza. Não quis me dirigir a nenhuma delas, notei olhares e leves sorrisos, mas eu nem estava com clima de pronunciar qualquer coisa, queria apenas beber e talvez pensar em algo que me relaxasse. Pensei seriamente em me abrir mais para conhecer novas pessoas, mas cadê o estímulo que vem de dentro? Talvez a noite ainda reservasse algo especial para mim.

Resolvi entrar no bar e sentei em uma das várias mesas vazias, bebi a curtos goles saboreando uma cerveja, logo uns músicos amadores talentosos se apresentaram e assisti suas apresentações, no pequeno palco sombrio, existiam umas máscaras envelhecidas perto do teto e luzes fracas por detrás delas. Surgiu uma moça do nada quando virei o rosto para o lado, ela estava vestida com chinelos pretos, saia cigana vermelha, blusa decotada preta solta na pele, e tinha pulseiras, brincos e bolsa em estilo hippie; era de baixa estatura com pele clara, cabelos pretos ondulados até os ombros, olhos castanho escuros e uma boca com sorriso fascinante; ela passou perto de minha mesa, deu um sorriso que mesclava inocência e luxúria e seguiu até o microfone. A pequenina foi ao palco e cantou músicas nacionais e estrangeiras famosas sobre amores decadentes, mulheres cativando homens e outras coisas românticas sugestivas em MPB, blues, jazz e rock progressivo.
Cantou com uma certa técnica e muita emoção em sua doce voz que variava do soprano ao contralto e nas névoas de cigarros e charutos daquele bar eu fui embalado pelo seu canto sedutor. Sorria discretamente para minha direção enquanto cantava e pensei que não era comigo, mas eu era o único homem na posição de seu sorriso, então sorri. Fui recompensado com um sorriso completo com dentes e olhos brilhando; ela mal sabia que eu tinha uma grande atração por cantoras, era como se ela soubesse como me cativar. Pensei "mocinha, não faz assim que você me leva no bico", virei o rosto para disfarçar meu interesse por ela e acabei minha primeira garrafa de cerveja barata. Ela andou devagar desviando das mesas e cadeiras, pediu uma cadeira, disse a ela que levasse as cadeiras que quisesse, então sorriu para mim, desistiu das cadeiras e sentou-se perto de mim dizendo estar solitária e interessada em conhecer novas pessoas.

Não sou vítima do amor romântico, mas por aqueles minutos eu só queria ilusões, pois a realidade era drástica demais para que eu me concentrasse nela. Sentou-se colada ao meu corpo e pedi a balconista bonitona uma garrafa de vinho tinto bem doce acabando por sacrificar todas as cervejas baratas que compraria. Li o rótulo daquela garrafa fingindo ser algo inédito e pedi mais um copo para a hippie que bebeu comigo sem pestanejar, a mesma era baixinha, talvez tivesse pouco mais que um metro e meio e pés por volta do tamanho trinta e quatro. Conversamos assuntos inteligentes e divertidos regados a álcool, depois bebemos uma garrafa de vodka paga por ela que me rasgava a garganta mas valia a pena pela companhia.
A hippie me perguntou algo que não lembro, quando virei o rosto para respondê-la fui interrompido por um beijo na boca; nem tive tempo de pensar, foi súbito. Ela me abraçou de lado pelas costelas, paramos de nos beijar e ela permaneceu fortemente abraçada a mim. Quase tive um torcicolo para beijá-la pela nossa diferença de altura, mas ignorei a dor e continuei abraçado fazendo-lhe carinho na nuca e cabelos, assim está vamos calados apreciando aqueles momentos. Conversamos ainda mais e não nos apresentamos por nossos nomes parecerem obsoletos. Pegamos nossas garrafas de vodka e vinho e caminhamos abraçados bebendo no gargalo como se nos conhecêssemos há tempos. Entre um gole e outro, mais beijos e abraços apertados surgiam e os minutos pareciam passar mais rápido.

Deitamos num gramado mais afastado na madrugada e observamos estrelas, falando coisas intelectuais e bobagens, já estávamos arrastando a voz pela embriaguez. Aqueles momentos foram tão profundos e gostosos parecia até uma piada do suposto destino, pois eu era imã de mulheres problemáticas. Então ela me deu um bilhete fechado e me fez prometer que eu só abriria quando chegasse em casa, aceitei a carta com curiosidade, mas fui fiel ao compromisso pedido por ela. Depois de várias horas juntos nos despedimos calorosamente com abraços fortes e beijos selvagens com mordidas, perguntei se a encontraria novamente, lembro de sua voz arrastada dizendo que ela me buscaria para comemorar meu aniversário mais tarde. Brindamos o aniversário dela com o resto de bebida que tínhamos, ela bebeu tudo num só gole. Várias horas depois eu acordei e li o bilhete que estava todo amassado dentro de minha carteira, continha um endereço de um cemitério na cidade vizinha com o horário de 16h e com um beijo em batom rosa claro como assinatura.
Almocei e me arrumei ainda com um pouco de ressaca; era uma tarde nublada e cheguei ao cemitério no horário marcado, fiquei esperando por muitos minutos até que tive uma curiosidade por observar a beleza dos túmulos e mausoléus. Notei duas garrafas por trás de um arranjo de flores, em um túmulo todo colorido, provavelmente era de alguém que morreu jovem. Aproximei-me e removi um vaso com flores mortas da frente da lápide e percebi que eram as garrafas que a hippie e eu bebemos na madrugada, logo consegui ver a lápide agora descoberta e encontrei a foto da moça com aquele sorriso convidativo e os dizeres "Camila Arlequim Vinhedo. Nascimento: 20 de março de 1940 - Falecimento: 21 de março de 1964. Uma vida de emoções fortes que foi prematuramente interrompida". Fiquei triste pela morte dela e pensei se haveria um próximo encontro ainda naquele dia. Dessa vez eu tinha me engalfinhado com um fantasma hippie, já me relacionei com várias mulheres loucas, mas ter romance com uma mulher que já morreu é novidade para mim... realmente a lei de Murphy me persegue.

- Mensageiro Obscuro.
Março/2011.

Foto: Isis Valverde. Postei essa foto por achar o rosto e sorriso dessa atriz lindos.

sábado, 19 de fevereiro de 2011

Entre Livros e Armas

Por estudos e pesquisas
viajei em minha mente,
subi degraus em mim
e segui rumo ao meu abismo
como um ser onírico.
Assumindo forma e nome,
revelados em fantasias
no mundo dos sonhos.

Aprofundei-me no corredor
nas largas passagens,
em trajetórias perante
mistérios e enigmas.
No espaço-tempo vibratório
vivo aventuras maravilhosas
nos achados e perdidos
distantes do palpável.

Cheguei ao meu abismo pessoal,
território muito abstrato
de histórias mescladas
em realismo fantástico,
vivo realidade e fantasia.

Sou aventureiro do conhecimento,
e híbrido metamórfico,
montado como esfera e elipse,
triângulo e quadrado
expresso-me por símbolos.

Entre livros e armas
absorvo conhecimentos
e prazeres profundos,
produzindo e reformulando
o que sou e quem sou.

- Mensageiro Obscuro.
Setembro/2009.

Foto: Quarto do V na Galeria Sombria do filme "V de Vingança" (V For Vendetta), 2006.

sexta-feira, 11 de fevereiro de 2011

Os Prazeres Solitários

Tenho tendência a me isolar, minha família por várias vezes insistia para que eu me entrosasse com gente da minha idade, mas na infância e adolescência eu não tinha interesse em contatos e julgava que meu mundo era muito distante da mentalidade do pessoal da minha faixa etária. Pensei que ser jovem era péssimo por falta de poder, prestígio, imponência, confiabilidade e tantas coisas que geralmente são alcançadas na fase adulta por algumas pessoas. Com o passar do tempo passei a encontrar pessoas interessantes que regulavam de idade comigo, então o tempo revelou que as pessoas têm um prazo de validade na minha vida. Essa entrada e saída de contatos sociais e a durabilidade das relações envolve muitos fatores e realmente os filósofos, cientistas e outros pensantes não erraram ao dizer que o comportamento humano é um enigma imenso e indecifrável. Aprendi que quando todos vão embora ou sigo meu rumo solitário só resta comigo o conteúdo desenvolvido com elas. É bom ser solitário sem raízes e grilhões que me prendam a pessoas e território, por isso amo desapegado de forma talvez mais racional, lógica, organizada e metódica em tantas realidades distorcidas e distantes do entendimento desse plano, e não sei amar de outra forma.

Amo de forma diferente, e é fundamental que a individualidade e privacidade de meu estilo de vida sejam valorizadas e respeitadas e esse é um trabalho só meu e de mais ninguém. A constância só me faz enjoar de qualquer pessoa ou lugar, é como se meu espírito fosse nômade e tudo ao meu redor precisasse ser mudado. Por mais que exista amor mútuo, é cansativo vivenciar a rotina depois de uns meses, eu certamente não sirvo para ser marido e pai e isso não é defeito, os maiores defeitos são os que nos ferem, o que fere outras pessoas pode ser mera questão interpretativa. Não consigo amar sem ter saudades, por isso considero a distância interessante e saudável para produzir assuntos para conversar quando existirem reencontros com pessoas que aprecio. Gosto de me aventurar pelos tantos mundos nos quais eu possa voltar para contar meus acontecimentos e se estiver tão próximo em todos os momentos perderei o prazer do reencontro que é um momento tão gostoso em nossa existência tão efêmera.

Para apreciar os mundos misteriosos e secretos de prazeres solitários é preciso ser introvertido, a criatividade se faz necessária para nos divertir desde que também tenhamos uma mentalidade avançada para ir além do senso comum. Esse aprofundamento pessoal de vasculhar seu próprio universo interior em busca de mistérios e segredos é tarefa árdua para poucos, muito poucos capazes de viver com o resultado de tamanha aventura. Aqueles que voltarem da caverna platônica de seu universo individual serão dotados de personalidade própria, incompreendidos por não mais estar sob o domínio do senso comum. Alguns dos prazeres solitários mais interessantes são: estudar e pesquisar sua própria personalidade conhecendo seus pontos positivos e negativos; produzir intelectualmente; desenvolver individualidade; criar convicções e limites; amar-se e respeitar-se. Dentre tantos prazeres solitários que descobri e desenvolvi esses são os maiores que conheço, mas outros introvertidos podem ter alcançado diferentes benefícios em suas jornadas íntimas.

É importante estar com a cabeça preparada para lidar com a solidão, perdas, fracassos, mortes e tantas outras coisas que colocam terror no interior de qualquer indivíduo, e se eu disser que foi e será fácil lidar com toda essa negatividade perpétua serei um hipócrita e demagogo de sangue sujo. Os sofrimentos desnecessários devem ser evitados, por outras vezes quando sábios os sofrimentos nos fazem perceber que existem dores que nos projetam para a evolução, e há quem diga que o sofrimento faz crescer, eu comprovo a veracidade dessa afirmativa, por isso não nutro esperanças. Os caminhos solitários são fascinantes, são jornadas únicas traçadas pelos interessados em explorar novos mundos dentro de si mesmos, onde realidades colidem, a paz e guerra mentais mesclam-se, realidade e fantasia convergem em interseções oníricas nas quais os filtros mentais separarão a possível veracidade e dessa forma firmamos nossa introversão capaz de nos levar e trazer de volta da zona crepuscular do fundo de nosso ser .

- Mensageiro Obscuro.
Fevereiro/2011.

Foto: Logotipo da série de TV "Além da Imaginação" (The Twilight Zone, 1953-1964) criada e apresentada por Rod Serling.

quarta-feira, 6 de outubro de 2010

Troféu Surreal

Esmurrei um padre pegando sua idolatrada cestinha transbordando de fé verde, vandalizei o quadro vermelho do ditador gigolô com anarquia preta, também destruí os cabos transmissores daquela emissora televisiva e ainda arranquei umas máscaras sangrantes rindo copiosamente.

Au, Au, ou... ou! Chutei a poltrona, manquei feio. Onomatopéias...

O arame farpado prendeu e rasgou um idiota que insistia em babar fezes enquanto resmungava ferido e amedrontado no quintal. Eu não tenho pena, não tenho mesmo. Que se exploda meu cinismo e sujeira moral, assumo mesmo: te desci a porrada!

Te amarrei para assistir sua desgraça, solei em meu baixo elétrico chorando e gritando desesperadamente e duas cordas grossas de metal arrebentaram cortando seu rosto.

Scarrf! Escarrei uma goma grossa e visceral que te encapuzou nessa podreira toda. Cuspi, sim senhor e foi fodido, você quase se sufocou no meu catarro.

Bati palmas e gargalhei do teu medo, pois te odeio, é puro sadismo meu. Pausa para meu riso! Eu quero rir, cacete! Ha, ha, he, he. Satisfeito!

Posso falar mais alto? Posso sim! Nenhum babaca vai me impedir, não podem te ouvir gritar! Eu tenho o megafone e seus ouvidos vão estourar com minha histeria!

Pingue, escorra nesse show desgraçado onde gerarei insanidade com tanta vodka na idéia, vou colocar a culpa nessa cachaça. Tá, eu sei que não é cachaça, trepe com o gargalo!

Eu mato e torturo mesmo, eu te torturei e matarei mesmo na insônia voraz que me prostitui nessa merda fedida. Qual é a tua? Diz pra mim!

Só na minha cabeça você existe. Pare de chorar, é o fim!

Engulo risonho a chave para minha fuga, fico trêmulo com minha confissão amassada na mão, então rasgo o chão para longe do meu rastro rubro. Eles chegarão para nos recolher, mas não se preocupe, você não foi escondido, sua cabeça está nessa mão e já finquei teu corpo como troféu no portão de casa. Enrolei eles  no telefone por meia hora dando um prejuízo, e agora eles querem me exibir e já estou devidamente trajado para isso.

- Mensageiro Obscuro.
Setembro/2010.

Foto: "Bloody Trophy", troféu feito de sangue humano e sangue animal por Thyra Hilden e Diaz.
Portal da artista: Thyra Hilden

terça-feira, 7 de setembro de 2010

Romance Arriscado

Mesmo que estejamos fisicamente distantes estarei emocionalmente próximo,  sei que não sou o mais romântico dos seres e talvez eu não tenha as palavras certas para lhe cativar o entendimento de parte do que se passa em mim, não tenho domínio dessa empatia. Desejo-te pelos meus sentidos  e pensamentos que voam pelas doces e amargas nuvens que engulo durante minhas jornadas, simultaneamente enquanto estou em sua presença. Fingiremos que o tempo parou, que não temos expectativas, que somos inocentes descobrindo o amor pela primeira vez, assim seguiremos, ignorando a inconveniente existência de obstáculos entre nós.

Nesse tempo restante assistiremos o pôr do sol e dormiremos antes que ele se erga novamente, celebrando nossos momentos passageiros como se fossem os últimos. Num encontro entre o etéreo e o material negaremos a cobrança de certezas nessa vida tão incerta, onde  mora a efemeridade existencial que tanto nos fere, ainda nos proporciona prazeres na persistência da convicção. Sejamos então corajosos para nos afundar nessa experiência na qual a virtualidade e realidade revelam nosso romance arriscado, que de tão incógnito nos fascina e envolve.

- Mensageiro Obscuro.
Setembro/2010.

Foto:  Cena do filme "Asas do Desejo" (Der Himmel über Berlin) de 1987.

terça-feira, 24 de agosto de 2010

Sabor da Guerra

O rubro sabor da guerra
está em meus lábios,
teu medo virou banquete.

Tua agonia sustenta
meu desejo de caça,
estou acima de tua sombra.

Observo teus movimentos
e logo conhecerás meu poder
em rasgar-lhe a carne.

Sou o terror que corre
enquanto teus ossos quebram,
tu esfriarás em minha lança.

- Mensageiro Obscuro.
Agosto/2009.

Foto: "Crusades - The Massacre of Antioch" por Gustave Doré.

terça-feira, 6 de julho de 2010

Serenata Mortuária

O silêncio era a existência de leves murmúrios de folhas secas nas noites silenciosas, os sussurros misturavam-se à escuridão, fazendo o vento frio ao ouvido passar de um lado ao outro. A paz era firme naquele bosque gélido, animais fugiram assustados sem nenhum motivo aparente, algo estava perto, o que era eu não sabia. Pensei no ápice de minha solidão naquele local misterioso sobre onde estariam os amáveis brilhos das luzes e por qual razão o céu tão escuro não me revelava a intensa prata lunar. Que segredos guardavam esse lugar pelo qual caminhei? Eu filosofava amando aquela beleza tão sombria, aqueles encantos tão marcantes que me tornavam parte daquele local de uma forma inexplicável. Queria conhecer mais, queria ser parte daquele solo, flora, fauna, vento, água e tantas outras coisas que compunham o cenário de uma beleza noturna.

Pensei e mais perguntas e dúvidas vieram junto com o medo, senti uma baforada quente ao pescoço e vi um vulto correr veloz como um fantasma afoito, seu barulho cessou, voltei ao meu caminho, um tanto assustado, mas ainda curioso em sair daquela mata. Inesperadamente fui arrancado do chão e sucumbindo ao pânico fui arrastado árvore acima... meu pescoço foi rasgado, senti-me escoando em jorros, lentamente uma fera sugava meu sangue. Fui atacado por um vampiro ou demônio? Não importava. Fui mais uma nota nessa serenata mortuária, novamente veio o silêncio da noite.

- Mensageiro Obscuro.
Outubro/2006.

Foto: "Death as a Cutthroat" de Alfred Rethel (1851).

domingo, 27 de junho de 2010

Incógnitas da Personagem

Erguemos nosso pequeno império
com valores tão intensos,
fixos como cicatrizes fundas
rabiscadas como lembrete.

Vivi doces enganações sensoriais
em seu paraíso tão secreto,
onde a realidade se revelava
a partir da sombra da dúvida.

Minha caneta trêmula correu,
garrafas geladas reluziam o litoral
acompanhando-me no breve luto,
a fortaleza ruiu aos meus ouvidos.

Descobri incógnitas da personagem,
ela virou uma página passada,
novas lágrimas não cairão,
pela quebra da máscara que amei.

- Mensageiro Obscuro.
Janeiro/2009.

Foto: Imagem sem referências cedida por minha amiga Anaphylaxxya.
Blog da Anaphylaxxya: Em Busca da Risada Perfeita

terça-feira, 22 de junho de 2010

Turbilhão de Emoções

Sou um emaranhado de sentimentos, uma mistura de ações e reações; tantas dúvidas entre tantas certezas fizeram a colcha de retalhos que de tão mesclada virou algo incógnito. O peão gira como minhas emoções nessa roleta russa existencial, logo caminho e até corro entre tantos rodopios insanos nessa espiral. Sigo essa aleatoriedade, completamente impetuoso e empírico nesses breves momentos de minha curta existência. Vivo momentos nos quais os instintos afloram hibridamente embebidos em fortes palpitações interiores, capazes de me atirar como uma flecha rumo ao alvo de experiências desconhecidas. A contínua roleta de prazeres e dores gira tão ativa em mim, gira tão ensandecida que por vezes me entorpeço nas escalas dessa energia trôpega.

Sinto aos poucos o descobrimento mais profundo do amor, ódio, alegria, tristeza, perdão, rancor, paz, guerra, otimismo, pessimismo, antecipação, paciência, serenidade, agitação, êxtase, terror e tantas outras nuances que espalham-se no fundo de minha mente. Vivo e persisto entregando-me a esse vício de conhecer diferentes coisas, e arrisco experimentar tantas emoções que saltam de mim tão ávidas por sua revelação. Da decadência ao apogeu eu me entrego nos dias e noites dessa efemeridade, então não morrerei com o amargo fel da inércia escorrendo pela boca, pois me aprofundo nas reticências da continuidade.

Esta é a vida, melhor ou pior não pode ser, pois este ato de ser falho e rebelde, nada mais é do que parte da minha realidade em ser um turbilhão de emoções. Então abro-me nesse espetáculo solo onde aprofundo-me no vazio de onde retorno preenchido pelo alvoroço das transformações.

- Mensageiro Obscuro.
2004.

Foto: "A Natureza das Emoções", trabalho científico do psicólogo pós-doutor (phD) licenciado Steven J. Chen.
Página do cientista: Steven J. Chen

domingo, 20 de junho de 2010

Rastejante Maldito

Faminto em profunda decadência
e miséria rasteja o trôpego,
em sua desgraçada vida
o indigente apenas existe.

Farejava dor e putrefação,
ao mastigar restos e carniça
nomeado mordazmente:
Rastejante Maldito.

Rejeitado com chorume nas veias
sua carne repuxada sustentava
uma pele cadavérica
que sorria doentemente.

Distante de nossos sentidos
a fantasmagórica criatura
desejava uma vida verdadeira
mas só levou migalhas e surras.

Morreu! Um sem-número de cabeças
observaram seus restos mortais
negando que sua origem
é o mesmo ventre nos pariu.

- Mensageiro Obscuro.
Março/2010.

Foto: "Escolhas" por William A. R. Ferreira.
Portal do artista: Will Artes

segunda-feira, 14 de junho de 2010

Nossas Memórias

Lembro de um banquete leve para dois,
sabores sensitivos e afrodisíacos,
a malícia de nossas faces marcantes,
bocas provocantes e corpos quentes.
Nos trajávamos com fantasias,
desejoso a abracei intensamente,
o cheiro e calor me excitaram,
seus pêlos arrepiaram
enquanto te agarrei.

Mascarada e coberta deitou-se
em meu divã enquanto a analisava
para descobrir os encantos
um pequeno corpo libidinoso,
que lentamente se despia
provocando-me com seus lábios.

Na longa e extasiante noite
chocolates derretiam aos beijos,
nossas peles atritavam-se
e atingimos o apogeu do prazer.
Acabou-se tudo, mas lembrarei
Que essas são nossas memórias...

- Mensageiro Obscuro.
Abril/2008.

Foto: Foto romântica sem referências encontradas. Adquirida no Google Imagens.

quarta-feira, 26 de maio de 2010

Missão Preciosa

Cadavérico e envolto em mortalhas,
ele empunhou sua foice necrótica
e montou seu cavalo fantasma.

Da interseção de luzes e sombras,
sons e silêncio mesclavam-se
anunciando sua nobre chegada.

Exterminou centenas de vidas
traçando a tênue passagem
da matéria ao espectro.

Então o ceifador sinistro sorriu,
ao cumprir sua missão preciosa
naquele conflito degradante.

- Mensageiro Obscuro.
Agosto/2009.

Foto: "Death on The Pale Horse" por Gustave Doré.

quarta-feira, 28 de abril de 2010

Troca de Mundos

PRIMEIRO ATO - O MUNDO DE ZILLIUM.
Em um planeta chamado Zillium várias raças inteligentes existiam, incluindo a raça omanur, composta por humanóides de peles, cabelos e olhos de cores variadas, sendo donos de poderes físicos e místicos exclusivos. O céu verde claro de Zillium entardecia mostrando suas duas luas: a minúscula e rosada Arumá e a azulada e grande Riunokô. Então, viajando pelos ares um filósofo aventureiro omanur chamado Durganara voava veloz, o vento batia em sua longa cabeleira cacheada azul com mechas roxas, seu rosto de pele muito branca e lisa gelava com a ventania, enquanto sentia o peso de seus dois grandes livros místicos na mochila presa às costas. Durganara sorria ao sentir a pressão da velocidade de voo de Nitz, seu dragão branco entediado e introvertido com um espesso bigode em sua face alongada; seu corpo era esguio com  dois pares de patas fortes e longas, com garras curvas prateadas; suas asas membranosas eram imensas com grossas membranas e sua cauda continha escamas afiadas em forma de leme. Voando pelas tão conhecidas terras eles observavam cidades e aldeias pequenas, montanhas nevadas com picos imensos, abismos sobre as planícies formando cânions, vulcões inativos e densas florestas, aquelas lindas paisagens cativavam quem as percebesse, logo sua parada estava próxima, desceria no castelo Kágura que era conhecido por ter dois imensos leques sedosos próximos à porta principal.

Durganara encontraria com seu velho amigo Eldritch, então pousou com seu dragão e desceu em um só salto contra o chão, suas pernas e botas fortes suportaram o impacto facilmente. Respirou fundo, arrumou seus cabelos, puxou sua capa e seguiu rumo ao grande portão, Nitz olhava e resmungava para que não demorasse pois estava faminto e caçaria uns krentz pelas fazendas próximas dali.

- Reikt! Quero encontrar o sábio Eldritch, ele me convidou para vir a Kágura, pois ele quer falar comigo. - Durganara sorria para o guarda Valdef, um jovem militar e grande apreciador de seus livros.
- Reikt para o senhor também! É um prazer tê-lo aqui. - Valdef deu um soco duplo fraco contra as duas mãos de Durganara que retribuiu o cumprimento, sorriram e o guarda o guiou pelo grande saguão sobre um imenso tapete verde e paredes de pedra escura. O visitante entrou em um elevador prateado a vapor, controlado por um goblin desajeitado e simpático chamado Chumerim, ele era  careca de baixa estatura como sua espécie, tinha pele verde escura, olhos amarelos pequenos, orelhas pontudas, uma boca grande com dentes pontudos e usava um uniforme preto.

- Murzam! Durga, você veio... vou lhe contar para que te chamei aqui, como bem sabe não largo os prazeres de minha introversão a não ser em casos realmente importantes. - Eldritch usava seu típico traje verde escuro com capa e um chapéu elegante e alto. Estava sentado em uma cadeira luxuosa de madeira, com as mãos sobre uma grande mesa de madeira com vários livros e pergaminhos velhos, poções, pós, pastas, incensos, varinhas, cajados e jóias nos quais desenvolvia suas pesquisas místicas.

O senhor Eldritch tinha 180 ciclos, o equivalente a metade em anos humanos, mas com aparência era a de um homem bem conservado de 45 anos de estatura mediana, pele morena escura, cabelos grisalhos ondulados e muito curtos, olhos castanho escuros e nariz comprido; já Durgana tinha seus 60 ciclos, o equivalente a 30 anos humanos com aparência de uns 16 anos. Os omanur eram a raça dominante em quase todas as áreas conhecidas e habitadas de Zillium, menos em imensas áreas misteriosas e virgens onde quase nunca nenhum homem ou mulher da raça retornou. O sábio contou sobre a mais curiosa descoberta de suas décadas de estudos e pesquisas: a existência de um mundo totalmente com uma única raça inteligente capaz dos atos mais cruéis e idiotas possíveis, com população colossal e repelta de problemas; com a ausência de criaturas inteligentes portadoras de poderes mágicos; onde existem religiões e uns seres chamados de "deuses"; fauna e flora diferenciados e agredidos pela raça dominante; e tecnologias avançadas completamente distantes do que se conhece de Zillium.

Eldritch nomeou tal mundo como "Umanir" e seus habitantes dominantes por "umanirtas", ele estava radiante, segurava os ombros do seu amigo alto e robusto enquanto falava. O aventureiro filósofo puxou um doce estrelado fosforescente de uma mesa ao lado e o comeu, as migalhas brilhavam sobre o tecido brilhoso e colante de suas vestes. Ele sorriu concordando com a missão e logo foi levado a uma sala especial no laboratório, onde Durganara vestiu um cinturão metálico prateado, enquanto isso Eldritch colocava um mochilão com equipamentos em um baú acoplado a uma grande cadeira, nela havia uma armadura metálica que estava aberta. Durganara sentou-se no artefato e esperou novas instruções do sábio inventor.

- Levei décadas para construir esse artefato que nomeie por Transferidor Essencial. Nosso mundo é limitado e talvez essa sua viagem possa nos trazer mais conhecimentos úteis, assim talvez solucionaremos nossos problemas que são mínimos comparados aos deles. Poderemos até ajudar o povo de Umanir tornando-os mais evoluídos. - Durganara ficou quieto enquanto Nitz esgueirou seu pescoço longo para a janela do laboratório-biblioteca de Eldritch e fez perguntas, obtendo respostas ficou triste por não poder ir ao curioso mundo de Umanir. Nitz despediu-se do seu amigo e voou pelos céus rumo a sua caverna gelada, que era conhecida por ter árvores imensas das quais jorravam cervejas e vinhos durante todas as semanas, por lá ele ficaria incomunicável manipulando livros e pergaminhos com seu poder mental de telecinésia, quando sentisse fome ele passaria por mais umas fazendas, sempre caçando um ou dois krentz por semana.

- Meu amigo, só confio em você para essa missão. Já sou um tanto maduro e cansado demais para encarar tamanhos pensamentos e emoções. No Transmissor Essencial, você alcançará um caminho mais longo e pesado do que conquistei ao entrar nesse artefato. Selecionei diversos equipamentos para sua viagem, creio que você enfrentará diversas coisas em Umanir. Registre esses conhecimentos e experiências para nós. - Após essa conversa Eldritch fechou a máscara da armadura, acessou um painel e recitou versos de conexão astral. Logo o corpo de Durganara vibrava com sons, luzes, frio e calor, sua viagem se iniciou para uma passagem dentro dos sonhos de alguém daquele mundo.

SEGUNDO ATO - VIAGEM DE DURGANARA À TERRA.
Minutos após, na Terra, o mundo nomeado como Umanir enfrentava guerras, ditaduras, mudanças político-econômicas, crises financeiras, corrupção, crimes diversos, degradação ambiental e tantos outros problemas no ano de 1964. Nesse mundo doente vivia um adolescente brasileiro localizado na cidade do Rio de Janeiro, no estado do Rio de Janeiro no Brasil. Seu nome era Valentino, um rapaz sonhador de 16 anos, leitor compulsivo de livros de fantasia e bastante introvertido. Ele queria muito que o mundo mudasse e por vezes se imaginava conhecendo outros mundos distantes da realidade da Terra. Sua mentalidade de mundo era pessimista, decadente, sofrida, fria, e desesperançosa; em seu semblante era notável tamanha

Em uma noite de sonhos Valentino se imaginou em Zillium, de alguma maneira chegou àquele mundo em forma de um fantasma. Poucos espíritos humanos viajaram oniricamente até Zillium. - Somente os mais fantasiosos dos humanos conseguiriam passar para aquele mundo - onde apenas alguns momentos de sonhos poderiam horas ou dias em vivência. Uma luz branca e forte saiu por baixo de sua cama, então um mochilão preto e grosso foi arremessado ao meio do quarto, logo após, Durganara também foi empurrado pela luz com a cabeça contra o mochilão; o mesmo saiu rapidamente da cama e começou a falar seu idioma; ao notar que Valentino não o entendia colocou uma tiara exótica e fina na cabeça e começou a falar em português enquanto ouvia o rapaz traduzido simultaneamente em omanurano, seu idioma natal.

- Saudações, umanirta! Sou Durganara Lumurines, vim do planeta Zillium e preciso conhecer esse mundo. Vim em paz e peço que oculte minha presença nesse plano. Seu sonho serviu de ponte para minha vinda a esse mundo. - Durganara estava tenso, não conhecia aquele tipo de quarto repleto de objetos desconhecidos, tudo era muito curioso, incluindo o rapaz não dormir com fitas roxas nos pulsos como era costume de seu povo. Explicou mais detalhes e após longas conversas optou em mudar sua aparência, então usou seu cinturão para alterar a forma, textura e cores de seu corpo e também mudou seus trajes. Valentino chocou-se com tudo aquilo, mas instigado pela curiosidade não conseguiu dormir e continuou sua conversa em tom baixo com o filósofo aventureiro, assim trocando diversas informações úteis, com isso Durganara usou um artefato que o fazia mudar a cor dos cabelos e olhos, assim como alterou a forma de seus trajes para ficar parecido com um terráqueo.

O jovem humano preparou um lanche, mas Durganara estranhou a comida de seu anfitrião ao rejeitar todos os cereais cozidos e carnes, só comendo verduras, legumes e frutas cruas com condimentos diversos, água açucarada com pitadas leves de sal. No dia seguinte ambos resolveram sair, Durganara estranhava os militares nas ruas, a barulhada de carros e motos, ruas sujas e quebradas, assim como tantas outras coisas aberrantes para um zilliano, incluindo os boatos de violência urbana e repressão de censura controlada pela ditadura militar. Através da tiara comunicadora ele gravava relatórios sobre o planeta, quando ficava solitário fazia anotações em uma tela fina e maleável, era uma espécie de pergaminho plástico mágico que saía por cima de seu cinturão e ficava em pé no ar enquanto ele escrevia, utilizando uma caneta flutuante e sem tinta. Realmente era um artefato exótico e muito útil.

Após vários dias de passeio pela Terra foi possível que Durganara conhecesse várias coisas, ele até conseguiu ler diariamente vários livros humanos, utilizando-se de um óculos especial de tradução simultânea saído de seu cinturão. Valentino queria usar o cinturão para se maravilhar com tantas possibilidades, até que seu novo amigo Durganara fez uma proposta ousada para que eles trocassem de lugar; o alienígena usaria poderes mágicos para enganar os sentidos dos pais de Valentino para que ele seguisse para Zillium, o rapaz aceitou e logo Durganara criou uma magia no chão do quarto do amigo utilizando giz de cores variadas, pedras, braseiro, um cajado, pós metálicos, palavras mágicas e algumas gotas de sangue de Valentino, conseguindo ativar um portal pela parede que sugou a cadeira onde o mesmo estava sentado. O jovem humano estava ansioso para conhecer Zillium, levou consigo alguns dos artefatos de Durganara e logo chegou ao laboratório-biblioteca de Eldritch em Kágura.


TERCEIRO ATO - VALENTINO VIAJA À FANTÁSTICA ZILLIUM.
Finalmente Valentino chegou a Zillium, aparecendo dentro do Transferidor Essencial, quando falou dentro da armadura Chumerim o recebeu, abriu o artefato e tirou-o de lá facilmente. Falaram gestualmente, então o rapaz usou uma tiara tradutora que lhe fora dada pelo seu amigo alienígena. O sábio saiu por uma porta próxima que dava para a biblioteca, ele chegou até Valentino, conversou com ele um tanto desconfiado e entregou-lhe uma carta de Durganara, ela estava em forma de um minúsculo cubo do tamanho da falange de um dedo polegar humano. Eldritch a colocou sobre a mesa e pediu que ela se abrisse, então o cubo se desmontou em um grande pergaminho retangular com cerca de meio metro e assim o sábio conheceu relatórios de seu amigo e os transcreveu para seus arquivos de estudos e pesquisas sobre o novo mundo.

Meses se passaram em Zillium, com isso Valentino treinou conhecimentos teóricos variados sob a tutela do sábio Eldritch e se empenhou em escrever as maravilhas daquele mundo; até o dragão resmungão Nitz conversou com ele, a princípio a desconfiança era mútua, mas depois o jovem conseguiu montar em sua cela e teve a experiência marcante de voar nas costas de um dragão; treinou um pouco de artes marciais em um templo localizado em uma montanha voadora; comeu doces que brotavam de vários arbustos e bebeu sucos e bebidas alcoólicas que saíam de árvores; falou com fadas, gnomos, duendes e até brincou de mímica com um fantasma brincalhão. Aquele mundo era realmente fantástico e livre, diferente da ditadura ferrenha e assassina de seu Brasil do golpe militar.

Enquanto isso, na Terra seu amigo Durganara estudava muito conseguindo aprender e ensinar facilmente, estabeleceu alguns contatos superficiais, conseguiu um emprego como técnico em eletrônica e com isso conseguiu pagar uma casa para si, forjou documentos com nome e números falsos e iniciou um trabalho de incitar nas pessoas sentimentos de liberdade, fraternidade, respeito e companheirismo entre tantas outras coisas; assim como também falava demais sobre ecologia, humanismo, ética, justiça e tantas outras coisas profundas e muito avançadas para a maioria das pessoas; Durganara até julgava medidas para mudar aquele mundo, falava sobre planejamento familiar e controle natal, métodos contraceptivos, legalização do aborto, apologia ao Estado laico, estudos sobre ateísmo e agnosticismo, estilos alternativos de vida e demais assuntos polêmicos que eram tabus na época.

Com tantas diferenças ideológicas ele foi considerado herege e ateu para a Igreja Católica, tão dominante no Brasil; assim como foi considerado anarquista, rebelde, revolucionário e subversivo para o governo militar que caçava opositores ao sistema vigente. Utilizando-se de documentos falsos Durganara criou para si a identidade de Hugo Tavares e também usava o pseudônimo Voz Rebelde com a qual divulgava seus ideais para universitários através de jornais clandestinos, certamente Durganara foi caçado pelo DOPS e fugiu ileso graças aos seus artefatos, pois não conseguia ter facilidade para fazer magias no planeta Terra onde a magia não é forte.

Os pais de Valentino o procuravam muito e já perdiam as esperanças que o filho estivesse vivo em algum lugar. Passaram-se quatro anos na Terra e oito anos em Zillium e Durganara já estava entediado e perturbado pelas coisas horrendas que conheceu na Terra, queria voltar para sua terra natal o quanto antes, até para evitar ser morto pela polícia torturadora da ditadura que estava cada vez mais poderosa e perigosa. Enquanto isso em Zillium, Valentino não mais se importava em voltar para seu planeta, já amava o novo mundo acima de tudo. Esse amor pela fantasia de um mundo mais simples passava até por cima da amizade intensa com Durganara.


QUARTO ATO - A DESILUSÃO NO BRASIL DITATORIAL DE 1968.
O filósofo aventureiro havia perdido todo o encanto pelo mundo dos humanos, pela primeira vez em sua vida começou a ter sentimentos decadentes, teve tristeza profunda, então sabia que só tinha uma chance de voltar a Zillium e era trocando de lugar com Valentino, assim ele voltaria ao seu mundo e continuaria sua vida pacata de estudos e aventuras bem mais leves que as tão perigosas aventuras terráqueas. Ele preparou ingredientes para a magia chamada Troca de Mundos, sendo que era uma magia muito poderosa e perigosa que poucos aprenderiam a preparar corretamente.

Durganara esperou uma noite de lua cheia do ano para montar sua passagem para Zillium, conferiu detalhes astronômicos e astrológicos, avaliou equipamentos de precisão e com seu cinturão foi possível começar a perceber um pequeno portal se abrir na parede desenhada. Seu cinturão apresentava sinais de falha, no decorrer dos últimos meses, até os cristais do artefato brilhavam menos, tudo por conta da incompatibilidade com a energia do planeta Terra que não recarregava corretamente seus equipamentos nos últimos meses daquele ano de 1968. Dentro de seu quarto em um bairro isolado do centro da cidade o filósofo aventureiro tentou expandir e manipular a energia mágica, no exato momento que estava com todos os aparatos para trocar de mundo sua porta trancada era esmurrada por um padre e por um agente do DOPS que o caçavam por incitar rebeldia no povo do Rio de Janeiro. Sentado a uma cadeira que servia de portal um vórtice energético aumentava revelando o laboratório-biblioteca de Eldritch. O portal cresceu e Durganara passou por ele com sua cadeira e mochilão de artefatos.

- Meu amigo, temos que trocar de lugar, seu mundo é muito louco, quero minha vida de volta. Troquemos de mundos agora, é meu último esforço, sente-se na cadeira, temos poucos minutos até que invadam minha casa e me prendam. Na Terra você se salvará pois é inocente e poderá usar uma poção de invisibilidade para fugir dos meus inimigos. Sou inimigo declarado de governos ditatoriais e empresas da fé e preciso de você para retomar minha vida nesse mundo! - Durganara estava com pressa e nervosismo, isso era raro para alguém tão equilibrado e seguro como ele, então Valentino se recusou a ir, e aproveitando uma distração do amigo que tinha deixado o mochilão e o cinturão ao chão o jogou na mesma cadeira e a trancou, acionando a alavanca de transferência do artefato; dessa forma ele retornou para a Terra, pouquíssimos segundos depois do curto momento que passou em Zillium.

Acabou-se a energia do portal e o mesmo se fechou de vez, então caído ao quarto estava Durganara com sua forma e roupas originais, o agente do DOPS e o padre que conseguiram arrombar a grossa porta, ao acenderem a luz chocaram-se com aquele ser exótico sentado naquela cadeira com uma expressão decrépita na face. Durganara na versão original era um tanto diferente do tão procurado Hugo "Voz Rebelde" Tavares, mas seus traços de cabelos longos e traços faciais se mantinham idênticos, a não ser pelas cores de pele, cabelos e olhos. O policial o tirou da cadeira, e junto com o padre atestaram que era ele mesmo o tão procurado subversivo cogitado como agitador político e aspirante a terrorista, este ainda estava atônito pela decepção com o amigo apenas chorava enquanto uma minúscula luz se apagava na parede do quarto, ele não resistiu a prisão sendo algemado e humilhado pelos dois inimigos. O padre se assustou com os símbolos místicos tão excêntricos e desconhecidos espalhados pelo chão e paredes daquele quarto pequeno e ficou em dúvida se lidava com um ateu herege mesmo ou se estava diante de um satanista.

O tão caçado Voz Rebelde sentia que estaria morto logo depois de alguns dias de tortura, vários conhecidos e colegas seus tiveram um destino terrível nas mãos dos torturadores a serviço da ditaduta. Levaram-no ao carro e ouviu diversas ofensas degradantes, mas isso não importava diante daquela dura e sofrida traição de seu amigo que o abandonou no momento mais necessário. Durganara sabia que morreria naquela semana em uma cadeia suja, mas quando esteve preso pensou muito, chorou soluçando nervosamente rangendo os dentes, dessa vez com uma mistura de tristeza, decepção, raiva e amargura e tomou uma decisão drástica.

Durganara mordeu uma cápsula que levava presa abaixo de sua língua, retirou-a e colocou entre os dentes, mordeu-a suavemente, logo sentiu uma pequena gelatina de sabor doce espalhando pela língua rapidamente. Um pouco de dor se espalhou garganta abaixo, um forte suspiro foi dado e com um sorriso o extraterrestre encerrou sua existência na Terra, Hugo Tavares ou Durganara não mais existiam. Seu corpo caiu ao chão e definhou em poucos minutos na frente de outros presos políticos, o carcereiro, que segurava um terço católico orava rápido para que aquela cena grotesca de um corpo atrofiando e apodrecendo diante dele fosse apenas uma amarga ilusão terrificante. O rebelde não sentiria mais as dores de viver realidades tão sofridas no planeta ao qual passou a odiar tantas coisas, enquanto amava outras, a grotesca dualidade lhe feria por demais. Talvez Durganara reapareceria em Zillium e expulsaria de lá seu tão decepcionante amigo Valentino, fazendo-o retornar ao seu mundo natal. Na tentativa frustrada de voltar ao seu mundo o filósofo aventureiro conheceu a traição de seu amigo, por uma cápsula ele conheceu o sabor doce da morte, talvez mesmo após todos esses elementos Durganara ainda teria mais aventuras ao cruzar a misteriosa dimensão do mundo dos mortos, mas essa não seria uma aventura qualquer, seria uma aventura além da imaginação.

Observação: Esse texto é baseado em uma conversa que tive com a escritora Rita Maria Félix da Silva.

- Mensageiro Obscuro.
Abril/2010.

- Glossário -

DOPS = Sigla criada para definir o Departamento de Ordem Política e Social (DOPS), foi o órgão do governo brasileiro criado durante o Estado Novo, cujo objetivo era controlar e reprimir movimentos políticos e sociais contrários ao regime no poder.

Krentz = uma espécie de animal primitivo de inteligência muito limitada, capaz de ser facilmente manipulado por qualquer ser mais inteligente e poderoso, mas quando reunidos em bandos conseguem ser agressivos e até perigosos.

Murzam = expressão de alegria pela chegada de um visitante.

Reikt = saudação de saúde e respeito por quem chegou, só se fala uma vez por dia para a mesma pessoa enquanto sorri e meneia a cabeça.

Telecinésia = Poder psíquico que concede a habilidade de manipular objetos à distância com comandos mentais.

Foto: "Landscapes 001" por J. P. Targete, 2007.
Portal do artista: Targete Art

sexta-feira, 23 de abril de 2010

Sagrada Prostituta

Uma freira desfilou sorrindo
perto de uma igreja vazia,
com seu jeito faminto e lascivo
revelou tão muda o seu erotismo.

O hábito de fé e puritanismo
amarrotava contra meu corpo,
enquanto ela ria e chorava
tocamo-nos com lascívia.

Fez do altar uma grande alcova,
profanando hóstias e vinho
para nosso banquete, assim,
transgredia como dama herege.

Libertou-se de dores e pudores
como uma sagrada prostituta
em nosso intenso culto erógeno,
tornando-me seu ídolo fálico.

- Mensageiro Obscuro.
Março/2008.

Foto: "Erotic Nun" por Clovis Trouille, 1944.
Portal do artista: Clovis Trouille

domingo, 18 de abril de 2010

Uma Carta Que Não Entreguei

          Tive uma longa conversa com um amigo na semana passada, viramos a madrugada conversando e concluímos que realmente a vida faz piadas ou tem vezes que viramos meras piadas na vida, ah... essa é uma dura realidade das piadas que fazemos e das piadas que podemos ser. Essa era mais uma daquelas tantas realidades que devo enfrentar de cabeça feita, sim, de cabeça feita. Pensei em você novamente, minha querida e ser só seu amigo é realmente perturbador, ainda é mais chato quando me dizem que sou egoísta em "amá-la desejando ser amado", como se eu devesse viver um eterno amor não-correspondido enquanto quem comentou sobre isso já tem uma relação correspondida e sólida, assim é moleza dar palpite. Já se foi o tempo em que por duas vezes eu declarei o que penso e sinto por você e ao ser rejeitado sumi de sua vida por meses, evitava te encontrar, não queria conversas longas por telefone, internet, pombo-correio, telepatia e sei lá o que mais. Talvez o meu erro tenha sido em liberar tanta intimidade para que você descobrisse os carinhos mais doces que só você sabe fazer em meu corpo, exatamente do jeito que gosto, desde as leves provocações até leves marcas em minha pele que despertam minha libido.
         As coisas que vivemos juntos foram maravilhosas, mas  sinceramente... cansei! Já te disse várias coisas, já ouvi muito mais, não vou negar que tivemos grandes momentos. Sim, tivemos várias situações marcantes: desde belos passeios com pouco dinheiro nos bolsos; as gargalhadas de minhas piadas de humor negro para você; nossas situações tragicômicas regadas a calorosos abraços e voz baixa no ouvido; a cômica situação na qual pensavam que somos namorados, que eu estupidamente queria que isso virasse realidade; e o namorico despretensioso no portão de sua casa em pleno começo de madrugada, onde nossas vozes eram tão baixas e embaladas pelos nossos batimentos cardíacos tão grudados no abraço. Não tenho como esquecer o passado, boa parte das melhores coisas do ano de 2005 até hoje foram junto com você, eu seria mentiroso se dissesse que não valeu de nada.  Você é uma mulher cativante de quem sou íntimo e isso é cada vez mais escasso, portanto não preciso disfarçar frieza a ponto de dizer que você é só mais uma distração casual na minha vida.

         Sigo parte dos meus instintos e lembro de como sofri por tentar fugir ao que realmente sou e de quem sou. Entenda que sou só um animal selvagem se adaptando a uma sociedade degradante e destroçada por sua própria espécie dominante. Você não entende o que me fez te largar ao vento como se fosse folha seca rodopiando pelo ar aos comandos ambientais, assim, tão livre e solta para que seja feliz, ou para que pelo menos busque o que te cativa. Quer saber a verdade nua? Pois eu te respondo mesmo: a verdade é que cansei de tudo isso... cansei desse jogo infantil e limitado no qual você sempre recua, somos adultos. Não te quero pela metade e minha fome de viver momentos únicos com você é maior que as parcas esmolas que você atirou nessa minha cumbuca pidona, fazendo com que eu me considere um coringa excluído sobre uma mesa de poker. Você pensa e sente coisas que sua opacidade não me permitem desvendar, e sobre tantas questões dúbias e sou um homem de certezas, justamente suas dúvidas é que me atraíram jogando-me nesses brinquedos de parque de diversões de fantasia e dor. Pode ser que eu esteja em um devaneio poético típico de um idiota que ama e só sabe nutrir amores impossíveis, daqueles que escrevem suas fantasias copiosamente, regados a música com dor-de-cotovelos e álcool.

        Desisti de relacionamentos falidos com mulheres que nunca vão me amar, nasci para o prazer e não para a o sofrimento, te  digo: amar você dói, dói pra cacete! Já conheço sua conversa sobre voltar a tentar algo diferente como apenas amigos. Quando você me disse que eu deveria dar valor a esses cinco anos de tanto contato. Tanta amizade, tanto que reprimi em mim para não te tomar aos beijos mais intensos enquanto você provocava e recuava, sei como isso me feriu. Já quis passar uma borracha em tudo, tentar começar do zero. Orgulho-me de não ter me acovardado pela timidez e orgulho típicos do meu comportamento passado. Confirmo que estou cético quanto a tudo isso, cético de verdade por duvidar de um futuro namoro com você e até sobre encontrar uma mulher com quem realmente eu combine nesse louco quebra-cabeças onde minha forma é tão exótica e não existe encaixe exato. Eu deveria ter sumido de vez da sua vida, mas atendi seus chamados insistentes e voltei a te amar de uma forma diferente de antes, mas ainda assim um amor diferente da amizade do início de tudo. Sumir de sua vida teria sido minha opção mais inteligente a seguir. Hoje eu já teria evitado todos os encontros após a segunda vez em que me rejeitou, então só assim eu estaria melhor nesse sentido.

         É melhor perder tudo de uma vez no lugar de apenas me contentar com migalhas de incertezas e tantas dúvidas, mas o passado é apenas um prenúncio de lembranças para rir ou chorar num futuro. Preparei minha cabeça para suportar toda essa carga do luto pelo Dia do Fim que durará no máximo 24 horas, onde chorarei tudo que preciso bem distante dos demais. Farei isso bebendo e comendo alguma coisa, meio que sem vontade, com uma caneta na mão e guardanapos gentilmente cedidos pelo garçom cansado e entediado que me atenderá. Escreverei uns versos e estrofes ou linhas e parágrafos nessa minha decadência momentânea e assim, contemplarei o sol se pondo belamente em tons pastéis, com a brisa marinha surrando meu rosto já molhado pelas últimas lágrimas. Realmente você não tem noção do que se passa em mim, nem saberá, pois no dia seguinte serei um homem readaptado. Claro! Não vou choramingar por causa de mulher por mais que apenas um dia. Existem dezenas de outras opções pela frente e ainda tenho mais cinco nomes de mulheres para sair, escritos naquela agenda preta pequena, aquela mesma que nunca te deixei ler. Entre várias anotações existem opções de sobressalência para passeios que misturam conversas razoáveis, risos, carinhos, algumas possibilidades de beijos e talvez umas brincadeiras sacanas para não chegar em casa completamente casto. Por isso declaro o fim desse circo onde o palhaço era eu e você era a platéia, não quero mulher-problema, quero mulher-solução e assim sigo meu caminho.

- Mensageiro Obscuro.
Abril/2010.

Foto: "Don Quixote" por Gustave Doré.